Julgamento com perspectiva de gênero: em dois anos, resolução impulsionou mais de 8 mil decisões
Julgamento com perspectiva de gênero: em dois anos, resolução impulsionou mais de 8 mil decisões

Lançado em 2021 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Judiciário foi criado para orientar a magistratura na adoção de diretrizes que impulsionem um novo posicionamento da justiça por meio da equidade entre homens e mulheres.
Para garantir que o instrumento seja adotado no exercício da função jurisdicional, o CNJ instituiu a Resolução n. 492/2023, que tornou obrigatória a capacitação de magistradas e magistrados em direitos humanos, gênero, raça e etnia, sob uma perspectiva interseccional. O normativo completa dois anos nesta segunda-feira (17/1) e tem apresentado resultados importantes. Mais de 8 mil decisões já foram proferidas a partir do uso do protocolo.
Acesse o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero
Como parte da implementação da norma, foi criado, no âmbito do Conselho, o Comitê de Acompanhamento e Capacitação sobre Julgamento com Perspectiva de Gênero no Poder Judiciário, coordenado pela conselheira Renata Gil. O grupo funciona em caráter nacional e permanente e tem a função de monitorar a aplicação da resolução, bem como elaborar estudos e propor medidas concretas de aperfeiçoamento do sistema de justiça nas causas centrais ao protocolo.
Uma dessas ações foi a criação do Banco de Sentenças e Decisões com aplicação do protocolo. A ferramenta funciona como um repositório de julgados que contempla a perspectiva de gênero e permite acompanhar as atividades dos diferentes tribunais e segmentos de Justiça sobre o tema.
Até o momento, o painel registra mais de 8.134 decisões, com a maioria concentrada na Justiça Estadual. Os primeiros cadastramentos no banco foram realizados pelo próprio CNJ, mas o prosseguimento foi dado pelas cortes e conselhos vinculados aos emissores das decisões. Em 2023, foram registrados apenas 23 processos. No ano seguinte, houve um crescimento relevante, com a inclusão de 6,1 mil sentenças. Este ano, somente nos primeiros meses, foram cadastradas quase 2 mil decisões.
Os principais temas abrangem ameaça, perseguição, violência doméstica e descumprimento de medidas protetivas. Entretanto, a aplicação do protocolo não se restringe à violência de gênero. O banco de decisões mostra que a metodologia tem sido aplicada em diferentes ramos da Justiça. Em um caso julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região (TRT-2), em São Paulo, uma organizadora de eventos havia apresentado reclamação trabalhista após ser demitida durante a gravidez. A Constituição Federal e as leis do trabalho garantem às gestantes o direito de não serem dispensadas sem justa causa desde a confirmação da gestação até o quinto mês após o parto.
A análise do tema se submeteu à observância do protocolo. No relatório, foram ressaltados trechos do documento que reforçam que “o ambiente de trabalho é, na verdade, um terreno fértil para discriminações, pois a assimetria inerente à relação empregatícia favorece a prática velada de condutas discriminatórias”. A decisão, em favor da trabalhadora, garantiu a retificação da carteira de trabalho e o pagamento de multa.
Já no campo eleitoral, o Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL) utilizou o protocolo no julgamento de recurso que envolvia fraude à cota de gênero. O tribunal constatou uso de candidatura fictícia a fim de cumprir percentual mínimo de mulheres previsto na Lei das Eleições. Como resultado, a decisão invalidou todas as candidaturas elencadas por um partido político no município de Girau de Ponciano. Nesse sentido, o protocolo aborda questões de gênero específicas dos ramos da Justiça e ressalta a importância em se observar a legitimidade das cotas e a distribuição do tempo de propaganda e de recursos eleitorais.
Texto: Jéssica Vasconcelos
Edição: Thaís Cieglinski
Revisão: Matheus Bacelar
Foto:Gil Ferreira/Ag. CNJ
Agência CNJ de Notícias